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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

AFAILCA Crônicas - 37

Data: 24/11/2009
Nome: JOSÉ AIRTON PEREIRA SOARES
E-mail: airton.soares.as@gmail.com
Assunto: “MINHA SENHORA, DEIXE EU VER LOGO A SUA BUNDA QUE EU ESCOLHO O PENICO CERTO”.

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AFAILCA CRÔNICAS - 37
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LIMA & CIA
A Maior Loja de Ferragens do Século XX no Ipu

Por Antônio Tarcízio Aragão (Boris/Ipu.)

O SR. JOAQUIM DE OLIVEIRA LIMA (Joaquim Lima ou simplesmente Seu Lima) era um cidadão de família tradicional ipuense, católico fervoroso, muito sério e honesto. Escritor, músico e compositor, flautista refinado. A aparência circunspeta escondia o homem bonachão, bom caráter, bem humorado, amigo e muito brincalhão.

MANTINHA UM VASTO CÍRCULO DE AMIZADE e isso se confirmava todas as noites pela enorme roda de amigos na calçada de seu palacete, a “VILA GESSY”, na rua Coronel Liberalino, em alegres bate-papos que entravam noite a dentro. Ali se falava de tudo, da vida alheia, de comércio, de fazendas e gado, mas, o assunto predominante era política. A maioria dos freqüentadores daquelas rodas eram pessoas partidária da antiga UDN (União Democrática Nacional), partido político ao qual seu Lima pertencia.

LEMBRO-ME AINDA DE ALGUNS FREQÜENTADORES assíduos como os Srs. Abdoral Timbó, Dr. Evangelista de Oliveira, Dr. Félix Aragão, Djacir Torquato, Sr. Joaquim Dias, Sr. Abdias Martins, Sr. Caninha, Sr. Pinho, Sr. João Camelo; Sr. Valdemar Feitosa; Sr. Pedro Tavares, Sr. Edgard Corrêa, Dr. Thomaz Corrêa, Professor Bruno, meu primo Leocádio Sabino, seu fiel amigo Aderbal, e muitos outros que a memória infelizmente não quer me soprar.

DURANTE UM CERTO PERÍODO, posterior ao advento da USINA HIDROELÉTRICA inaugurada em setembro de 1931, quando de sua administração como prefeito, com a velha usina já impotente para o tamanho da cidade, o Ipu viveu uma boa temporada nas trevas. Seu Lima, abastado comerciante e fazendeiro, mantinha no quintal de sua casa, além de um curral com suas vaquinhas leiteiras, um conjunto gerador de energia elétrica para garantir a iluminação de sua casa, a qual, tinha na fachada frontal uma lâmpada muito forte que clareava sua calçada, uma parte do paredão e da praça “Jardim de Iracema”, principal ponto de encontro da juventude na época.

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O SR. JOAQUIM LIMA FOI PREFEITO DE IPU,
realizando uma boa administração, apesar de
seu mandato ter coincidido com a GRANDE SECA DE 32,
período em que foram escritas páginas tristes de nossa história.
A existência dos CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO
que abrigavam flagelados famintos e doentes
que morriam diariamente vitimados pela fome e por epidemias
que naquela ocasião não tinham o devido controle.

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ESSES CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO eram situados em regiões estratégicas do estado, o do Ipu era localizado no SÍTIO ESPRAIADO, de propriedade do Dr. Ubaldino Souto Maior e eram mantidos pelo governo para evitar que os flagelados invadissem a capital, Fortaleza. Para isso, mandava através das prefeituras, recursos em forma de mantimentos e remédios para atender a população concentrada, que não era só do município, mas também, oriunda de vários outros adjacentes.

PADRE GONÇALO DE OLIVEIRA LIMA, irmão do então prefeito Joaquim Lima, era o vigário de Ipu (1916 a 1948). Freqüentemente ele ia ao campo de concentração levar a palavra de Deus aos flagelados, celebrar missas e dar extrema unção aos moribundos. MEU PAI, BITIÃO, como raro proprietário de veículo à época, sempre que necessário, levava o padre em seu carrinho Ford 1928, àquele local, distante quase uma légua da cidade.

A LOJA DE FERRAGENS DO SR. JOAQUIM LIMA, a maior da região no ramo, cuja firma, se não me engano, era Lima & Cia. era localizada na mesma rua em que ele morava, Coronel Liberalino, vizinha à Pharmácia Iracema, do Sr. Edgard Corrêa.

ERA UMA LOJA MUITO GRANDE dividida em três partes: o primeiro salão havia um longo balcão e por trás as prateleiras coladas às paredes, com mais ou menos três e meio metros de altura e uma escada que permitia-lhes, a ele e a seu vendedor, o seu genro Cláudio Vasconcelos, alcançarem às prateleiras mais altas; logo em seguida, num compartimento menor, seu Lima mantinha o escritório, onde fazia sua própria contabilidade, seus escritos e recebia sua clientela mais importante, os seus amigos e os moradores de suas fazendas; nos fundos um imenso depósito, meio escuro, com piso rebaixado, abarrotado de vergalhões de ferro, enxadas, picaretes, chibancas, alavancas e um monte de tudo mais que se pudesse imaginar em matéria de ferragem. Ao lado, um comprido corredor ao ar livre que se interligava aos demais cômodos.

A LOJA MANTINHA SEMPRE UM ESTOQUE TÃO GRANDE que as prateleiras não comportavam tudo, daí, a necessidade de amontoar coisa e mais coisa por baixo do balcão, pelo lado de fora, etc., etc... De tudo era vendido: do vergalhão ao laminado; do prego ao parafuso; do ferrolho à fechadura; do martelo ao serrote; do ferro de engomar à brasa ao balde de zinco; do chumbo em barras ao peso para balanças; das tintas ao cimento; do prato de ágate ao penico de tamanhos e cores variadas, estes, expostos em cima da última prateleira, enfileirados em ordem de tamanhos e cores.

CONTAVAM, OS MAIS PRÓXIMOS DO SEU LIMA, UM CAUSO muito engraçado que se deu certa vez, com ele, em sua loja: um belo dia, justamente na hora em que o Cláudio havia dado uma saidinha, adentra no recinto uma exuberante senhora que pretendia fazer algumas compras. Seu Lima, com toda educação e presteza, notando a ausência do vendedor e a chegada de mais fregueses, não hesitou em deixar sua confortável cadeira para atendê-los. “Pronto minha senhora, o que deseja?”

A SENHORA COMPROU ALGUMAS COISAS e, um tanto quanto envergonhada, deixou por último os penicos que pretendia comprar. “Seu Joaquim Lima, eu agora queria ver os urinóis” Seu Lima olhou a escada, levantou o olhar para o alto das prateleiras onde estavam os urinóis, depois, em direção à porta da rua, na esperança de ver o Cláudio chegando para concluir a venda, e nada, Cláudio provavelmente ainda tomava seu lanche matinal.

O JEITO ERA ENCARAR A ESCADA e escalar seis a oito degraus para pegar os penicos. Desceu alguns modelos, grandes e pequenos, brancos, coloridos e enfeitados, deixando o balcão abarrotado de exemplares. A senhora escolheu, escolheu, olhou para cima e pediu: “deixe eu ver aquele maior” seu Lima; “qual é mesmo o número que a senhora quer?” indecisa, a mulher pediu outro, e mais outro, continuando em dúvida.

OLHANDO NOVAMENTE PARA O TOPO DA PRATELEIRA pediu um tipo ainda maior. Seu Lima, já exausto pelo sobe e desce escada, com seus 90 quilos de massa corporal, usando botas, suspensórios e gravatinha borboleta, dirigiu-se à indecisa senhora, já com o humor desgastado pelo cansaço, dizendo: “MINHA SENHORA, DEIXE EU VER LOGO A SUA BUNDA QUE EU ESCOLHO O PENICO CERTO”. A mulher não quis mais saber de nada, saiu resmungando, no mínimo, xingando seu Lima de velho enxerido, tarado...

SEU LIMA ERA REALMENTE UMA FIGURA ADORÁVEL, um cidadão amigo e prestativo, de um papo excelente e sempre cheio de graças, mas, nem por isso vendia barato. Diferença? Nem pensar!!! Aquele exemplo tinha que ficar para os seus sucessores e o Cláudio o absorveu à risca. Seu Lima gostava de pilhérias picantes e nas horas vagas, era também correspondente bancário, representante de loterias, escritor e historiador dos bons.
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Fonte: Do site da AFAI / Artigos – Crônicas / pág. 4
Acesso: 24/11/2009

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