Alvinha e de olhos azuis, Branca se destaca pelo trabalho com traços rústicos. "É difícil ter um filtro tão bem feito como os meus na região. Pode até ter igual", orgulha-se
Cinco das seis filhas de Branca que seguem sua profissão: Francisca, 45 anos, Raimunda, 41, Maria de Jesus, 34 , Maria das Graças, 48 , e Maria da Conceição Alves, 38
Jornal Diário do Nordeste - Ceará - 14/3/2010
Contudo, segue tomando conta da casa, da comida e de seu ofício, que aprendera ainda criança escondida do pai Antônio Alves Pereira. "Ele não queria que eu trabalhasse no barro igual à mãe dele", recorda. Branca nunca se deu por vencida. Após a roça e a escola, sempre pedia um pedacinho de barro à avó Raimunda Alves de Souza, chamada de mãe Munda. Começou a criar as primeiras panelinhas.
Porém, segundo ela, a avó não gostava de barro feito por "menino" e faltava-lhe paciência para ensiná-la. Branca, então, recorreu à tia e madrinha Maria Preta: "Ela endireitava minhas panelinhas e numa semana eu aprendi a trabalhar".
Quando o pai de Branca percebeu que não adiantava impedi-la de mexer com barro, pediu que a menina passasse a fazer peças maiores. "Nesse dia, parece que subi no céu", lembra a felicidade diante da permissão paterna.
A partir daí, suas peças começaram a ser comercializadas nas feiras do Ipu e no Piauí, para onde Antônio viajava de jumento. Quando voltava, ele trazia outras mercadorias para vender na região.
Por alguns anos, trabalhou ajudando no sustento da família. Dos cinco dias de produção, somente a quarta-feira era para si. Fazia a cerâmica e saía com as peças na cabeça para vendê-las na feira. Enfrentava sol, poeira e o mato estrada afora, percorria cerca de seis quilômetros.
Devido às dificuldades da época, Branca estudou só até a 3ª série primária. Deixou a escola para se casar, aos 15 anos, com o agricultor e primo legítimo Raimundo Alves Paiva. Com ele, teve 12 filhos. Desses, seis mulheres, que vivem apenas do barro.
Desde 2005, é Mestra da Cultura, pelo qual recebe por mês um salário mínimo do Governo do Estado. "Foi muito bom, minha vida mudou. Fiquei mais conhecida". Os encontros dos mestres cearenses são uma diversão para a artesã, que quase não deixa o Sítio Alegria.
A rotina é intensa. Acorda às 4 horas, ainda escuro, e só se deita às 21 horas. Faz as tarefas domésticas e dedica as tardes à produção, sentada numa cadeirinha na sala principal.
Em sua casa própria, mora com o bisneto Marcílio, o neto Marcelo e os filhos Antônio, José e João Paulo, único da família com ensino superior. Formado em Pedagogia, é ele quem cava o barro, enquanto espera conseguir emprego na área.
Desde o nascimento do caçula Antonio Milton, há 24 anos, Branca vive sem o marido, embora não seja separada oficialmente: "Ele ficava agressivo quando bebia. Mas não tenho raiva. Como passou a morar aí na outra casa, se precisar de mim, ajudo", fala com o coração cheio de amor.
FrAGMENTOS
Argila na Ibiapaba
AlÉM do Sítio Alegria, as localidades de Ipuzinho e Espraiado são famosas pela produção de cerâmica em Ipu, na Serra da Ibiapaba. Nelas, grande parte das famílias é envolvida com a atividade, como a de dona Branca. Suas seis filhas têm produção própria, bem como cinco netas.
Dois tipos de argila estão disponíveis para as artesãs na região: vermelha e roxa. Geralmente os homens são os responsáveis por buscar o barro na sua origem, ajudam a amassá-lo e ainda a fazer a queima das peças. Mas se precisar, as mulheres arregaçam executam todo o processo.
Para pintá-las, antes era usado o toá branco e vermelho. Foi substituído por tintas industrializadas. A produção é vendida em Ipu, na feira semanal, às sextas-feiras, e em cidades vizinhas.
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