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terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O Banho de Iracema na Bica de Ipu

Quis a Providência Divina e o Ipu nasceu no sopé da serra da Ibiapaba, e nela, nascido no seu cimo, o riacho Ipuçaba precipita suas águas 120 metros rochedo abaixo, formando a encantadora e conhecida Bica do Ipu, deixando maravilhados quantos a contemplam e com o batismo da natureza, quantos nelas se molham. , até o Sol -- o noivo da Bica --, torna-se brando, calmo, carinhoso. Ipu, portanto, poderia ser o maior ponto turístico cearense, pela casa e pela escada de pedras, pelos boqueirão e gangão, ou tão-somente pela Bica -- ladeada por pedras que apresentam figuras de objetos, de animais -- em que tanto se banhou sua filha Iracema.

Aliás, a respeito disso, ele contava...

Um dia amanheceu mais claro. O céu logo se enfeitou de nuvens, que pareciam flores brancas, flutuando no espaço. Os passarinhos cantavam, saltitando nos galhos verdes das ingás, dando um tom de alegria ao mundo que me cercava. O sol penetrava na floresta. De repente, da cova onde estava eu à espera de um animal que destruía minha roça, senti, então, algo estranho se apoderar de mim. E, como se adormecesse, sonhasse, vi que no alto do arvoredo pássaros de toda natureza seguiam gorjeando em direção à cascata, onde, ao mesmo tempo. havia pacas, caititus, veados, enfim vários animais, fazendo ala corno que tocados dum efeito misterioso.

Do lugar onde me achava, oculto na cova coberta de galhos, de folhas verdes, sem ser presenciado quando ouvia o rumor de passos, fazendo estalar leves galhos secos, a minha vista pousou sobre a figura esbelta de uma linda cabocla, solitária. Palmilhando o terreno numa singeleza sem igual, caminhava para onde caiam as brancas águas que desciam das alturas da Bica, sobre a companhia dos viventes da floresta ipuense, como vassalos obedientes à Princesa das matas do da serra. Com ela seguiram meus olhos. Não era grande nem pequena a distância em que se achava agora, que a perdesse de vista. Parou. Debruçou-se por sobre o barranco como se desviando do sopro frio brotado do arremesso da torrente. Descansou um pouco, pôs o arco e flecha numa grande pedra, depois o diadema de conchas e penas. Arrancou da cintura o ornamento que lhe fazia vestida, tirando, em seguida, as pulseiras dos punhos e dos tornozelos, aproximou-se do lugar onde caiam as chuvas, grossas e finas, em que se transformavam as águas que rolam do alto do rochedo, se esfarelando antes mesmo de chegar ao solo. E, desaparecida por algum tempo por ocultar-se atrás do tronco do gameleiro, abatido pelo tempo, procurei em vão refazer a visão. Demorei. Eis que surge, agora à frente, usando corno proteção à exibição de seu corpo urna folha de embaúba. Exposta aos raios do sol da manhã, pareciam gotas d’água a formarem um enfeite ele pedras multicores, cintilantes, que completavam o natural ornamento da Princesa das Selvas. E, do mesmo modo, ornando-se, seguiu a caminhada, desaparecendo de minha vista, nas brenhas sem fim, acompanhada pela passarada que tanto musicara seu banho.

Nunca mais voltei ali, sempre a sentir a comoção do belo e inesquecível tipo de mulher. Multas vezes, da minha casa de pedras, apreciei o desfilar das águas cristalinas na Bica do Ipu, mas não tive coragem sequer de rever a cena emocionante que jamais esqueci.

Um dia ouvi ler o que um branco escreveu, dizendo de uma índia de notável beleza, que, atravessando florestas e matagais, fazia o seu banha na Bica do Ipu. Arrepiei-me ante a estória, porque somente eu, o velho índio Peré, vi a famosa cabocla. A ninguém revelei o segredo, querendo dizer o branco disse o que se passou, porque imaginou, não mentiu, não viu, mas eu vi o banho de Iracema.”

FONTE DE RIQUEZA DO IPU

Ipu, poderia possuir uma das maiores fontes de riqueza, de desenvolvimento: o turismo. Para isso, necessário seria ainda que não a estrada pavimentada fosse feita, mas que fosse muito bem iluminada e, em chegando ao sopé da serra, duas fontes luminosas se instalassem às margens do riacho Ipuçaba, a focalizarem as cristalinas águas da decantada Bica. Com o soprar do vento, que é quase constante, as águas reluzirão à claridade das fontes luminosas que, para tal deverá ser perfeita. Dai por diante, como uma tela, a Bica poderá, também à noite ser apreciada. Que a piscina soterrada há mais de 15 anos, fosse recavada e restaurada, para ser mais uma atração ao mais exigente visitante. Construir um clube social e esportivo, um balneário, bar e restaurante adequados ao turismo, na encosta da serra, para, mais de perto, os turistas sentirem o cheiro de Iracema.

O turismo é uma fonte de riqueza, de que o Ipu pode se utilizar. O turismo faz nascer atividades especiais para o seu atendimento, como hotéis, restaurantes, diversões transportes etc. As empresas que forem criadas ou que se expandirem para atender aos visitantes e turistas estarão favorecendo novos empregos, pagando mais salários, recolhendo mais impostos, permitindo, com isso, que a população possa consumir mais e que o poder público tenha mais recursos para obras e serviços básicos que, por sua vez, criarão mais empregos e assim por diante. E tem mais: o turista, durante sua permanência na cidade, se incorporará à população ipuense, fomentando-a ao desenvolvimento.

Impõe-se, portanto, antes de qualquer coisa, uma definição dos poderes públicos quanto à política de incremento ao turismo em Ipu. Somos ricos, temos ouro e uma das maiores belezas naturais do Brasil — a Bica.


Por jpMourão - publicado na revista

CEARÁ ILUSTRADO de maio de 1969,

editada em Fortaleza, CE.



08/06/2008
afai-fatos históricos p02

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